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sábado, 11 de setembro de 2010

Pequenas mãos no volante



A incrível história do menino de 12 anos que roubou um ônibus sozinho e o dirigiu pela cidade por 80 Km

“Não bati nenhuma vez em ninguém”, afirmou o garoto com um certo orgulho no olhar. Confiante, no entanto, que logo seria repreendido pela mãe. O garoto não era assim desinibido. Demorou a soltar-se em conversa com a reportagem da Folha, que aconteceu na última semana, na sala de Sonia Regina Cesário, diretora da Unidade de Internação Provisória 7.

P.C.R.S., de 12 anos, havia ido parar no local pois roubou e dirigiu um ônibus por 80 quilômetros pelas ruas de São Paulo. Havia sido detido há seis dias e já implorava para deixar o local.

A história desse menino baixinho e troncudo, no entanto, não começa com o roubo do ônibus. O jovem é o mais velho dos seis filhos de Silvia Ribeiro da Silva. O pai, desapareceu e deixou para trás a mulher e os filhos.

Sebastião Dias de Jesus, pai de P., era cobrador de ônibus antes de desaparecer. Desde então, o menino busca incessantemente pelo pai em garagens de ônibus da zona leste da capital paulista.

Nesse caminho, acabou fazendo amizade com motoristas, cobradores e funcionários das empresas da região. O sonho não ser jogador de futebol, muito menos astronauta. “Meu sonho sempre foi pegar um ônibus e sair dirigindo”, revelou o menino, começando a perder a timidez.

Graças a um desses amigos, o motorista Edésio, passou a acompanhá-lo em seu trabalho. No trajeto, ia ao lado do motorista e ficava observando todos os detalhes da profissão.

Começou a ficar mais tempo fora de casa e logo já estava dormindo nas garagens das companhias de ônibus. A mãe não se preocupava. Sabia onde o filho estava. Passou a freqüentar outras garagens, e outras e mais outras. Até que chegou à Viação Cidade Tiradentes.

Por conta dos amigos que trabalham na área, ficou sabendo que o pai poderia estar trabalhando em uma empresa de ônibus na região do ABC paulista. Não teve dúvidas. No dia 10, dia dos Pais, por volta das 19h, resolveu matar a vontade, realizar o sonho e buscar o pai.

Aproveitou que o cobrador e o motorista do ônibus 10.188 estavam tomando um lanche, entrou no ônibus, ligou o veículo e saiu. Sozinho. Decidiu pelo trajeto no meio do caminho. Já conhecia àquelas ruas de cor.


“Não bati nenhuma vez em ninguém”, afirmou mais uma vez. Rodou 80 quilômetros, sem parar. Passou até pela Marginal Tietê e, como já estava tarde, decidiu voltar para a garagem e devolver o carro.

Deu azar. No meio do caminho foi parado por duas motos da Polícia Militar. Foi perseguido, ficou nervoso e perdeu o controle. Bateu na traseira de um veículo comandado por um de seus amigos. “Fui bater logo num ônibus da empresa, que estava com um amigo meu, o Aleluia”.

Foi levado para o 54º Distrito Policial. Lá, foi feito o boletim de ocorrência e o garoto ficou na UAI (Unidade de Atendimento Inicial). Está lá há seis dias e quer sair. Assustou-se com o que encontrou no local, inclusive um garoto que matou o pai a facadas.

P. afirma que já matou a vontade de dirigir e agora só quer voltar para casa e estudar. A mãe, ansiosa, espera pelo retorno do filho. Os dois aguardam agora a liberação do garoto para, enfim, poderem seguir para casa. De ônibus, porque não?

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Não mudou muita coisa

Esse texto pode se encaixar como uma crônica esportiva literária e narra algo fictício, mas baseado em acontecimentos e personagens reais. Espero que goste e comente! Bom feriado a todos vocês!



Há quanto tempo não vivenciava aquela emoção? Acordou, virou-se para o lado e observou a esposa. Ela parecia ainda mais jovem. Deu um sorriso de canto de boca, sentou-se na cama e observou pela janela que estava à sua frente. O dia estava nublado, feio, não importa. Para Márcio, aquela era a mais bela das paisagens. Iniciar um novo dia, preparar-se para a rotina.

Havia passado os últimos 14 meses em coma por conta de um acidente automobilístico. Acordou na última segunda-feira e, logo, pôde voltar à sua residência. Aquele domingo era o primeiro que passava após a traumática experiência.

Levantou, calçou as pantufas com calma e vestiu o velho moleton dominical. Aquele mesmo que ganhou das filhas em seu último aniversário. Quer dizer, em seu último aniversário acordado.

Desceu e foi em direção à cozinha. Quando olhou o relógio tomou um susto: 15h50. Ter acordado tão tarde tinha uma explicação lógica e racional. A família inteira havia comparecido à uma festa em homenagem à recuperação de Márcio.

Chegaram em casa, cansados, por volta das 7h da manhã. Todos ainda dormiam, à exceção de Márcio. Resolveu ligar a TV, baixinho, para não atrapalhar quem ainda descansava.

Por coincidência, o jogo de seu time de coração estava para começar. O Palmeiras vinha à sua mente em doces lembranças, embora nos últimos anos tenha mesmo dado dor de cabeça. Conhecia poucos jogadores, afinal a equipe havia mudado bastante desde a última partida que viu da equipe.

Aquela sensação era perfeita. O toque do moleton em sua pele lhe dava uma tranqüilidade e conforto, que só não eram maiores que a preguiça que tomava conta do homem de 52 anos.

O cheiro de flores tomava conta da casa. Havia recebido muitas de parentes, amigos e conhecidos pela recuperação da qual havia passado nos últimos dias. Elas estavam por toda a casa e traziam ao ambiente um aroma levemente doce e fresco.

O som dos pássaros era abafado pelos carros e ônibus que passam na rua de sua casa. Ele não se incomodava, afinal estava matando a saudade de tudo. Deu mais um suspiro aliviado e conferiu a escalação de seu time. Depois de 14 meses, enfim, voltava a ver a cena do seu time de coração escalado na tela da TV.

Guardava as lembranças de Ademir da Guia, quando ainda nem via futebol pela televisão. Sabia, no entanto, que não veria um craque daquela grandeza novamente. Não havia problema, já estava contente por conhecer os novos jogadores do Palmeiras que entrariam em campo em instantes.

Passaria pela saborosa experiência de descobrir, um por um, os jogadores do time. Como uma criança, que escuta um jogo pelo rádio pela primeira vez e fica a imaginar os jogadores e situações da partida.

De início não era difícil imaginar. Lá estava Marcos, o grande goleiro palmeirense. “O maior de todos os tempos”, dizia Márcio. Logo depois, um trio de zagueiro desconhecido: Maurício Ramos, Danilo e Fabrício.

Márcio Araújo, Edinho, Valdívia, Marcos Assunção e Rivaldo compunham o meio-campo. “O quê??”, assustou-se. De início, não conseguia acreditar no que via. Valdívia havia voltado? E Rivaldo? Depois de mais de dez anos estava de volta ao clube. Quando o narrador anunciou Kleber no ataque então...aí a alegria foi completa.


Melhor mesmo foi olhar para o banco e observar Luis Felipe Scolari no comando. Nessa hora teve seu ápice. Levou as mãos à boca. Queria gritar, pular pela casa, mas não queria acordar ninguém.

Quando olha para a escada repara o filho caçula, de 10 anos, está a observá-lo. Um misto de surpresa e estranhamento pela expressão de extrema felicidade no rosto do pai. O garoto também era palmeirense, por influência do pai. Desde bebê freqüentava as arquibancadas do Jardim Suspenso com a família verde.

“Filho, não é possível”, disse sorrindo. “O Rivaldo e o Valdívia voltaram! Eu não tinha ideia disso, que maravilha! Eu adoro essa diretoria! Sabia que viria coisa boa! Assim que tiver jogo no Palestra, nós iremos! E ainda conseguiram segurar o Kleber durante todo esse tempo! E...meu Deus! Veja quem está no banco de reservas! O Felipão! Não é fantástico, filho?”

O filho parou, olhou para o pai e pensou. Tinha de falar, estava incomodado. “Olha pai, o Valdívia reestréia hoje e o Kleber chegou faz dois meses. O problema é que eles foram comprados por um valor bem mais alto do que foram vendidos. Além disso, com dinheiro de empresários e torcedores por que o Palmeiras está devendo bastante! O Felipão chegou faz um mês e por enquanto...de 8 partidas venceu só duas. O Palestra Itália está fechado para obras e só volta em 2012. Ah e o Rivaldo...esse veio do Avaí. Aquele Rivaldo a diretoria não quer contratar...”, revelou o garoto.

Márcio não tinha palavras. Assustava-se cada vez mais a cada frase do filho. Então levantou, desligou a televisão e foi dormir novamente. Não havia perdido nada nesses 14 meses. Ao menos na parte do seu time.